Tal qual a cápsula transportada há algumas semanas pelo Falcon 9 e acoplada à Estação Espacial Internacional, fomos acoplados mais ou menos confortavelmente há alguns meses em nossas residências, com possibilidades nunca antes imaginadas de expandir nossas fronteiras intelectuais e de nos transformar em seres humanos melhores.
Em meio a rotina de manutenção de nossa estação, mesclamos atividades diversas a experimentos, além de direcionar nosso olhar para assuntos que nos intrigam, e procuramos soluções para questões que nos incomodam. Nesta categoria, está instalado o envelhecimento, quebra-cabeça a ser resolvido, com inúmeros estudos e enfoques científicos.
A negação da velhice seria uma técnica que usamos para não pensar sobre nossa própria finitude? Fazer as pazes com o assunto nos ajudaria de alguma forma ou deveríamos mudar nossos paradigmas sobre nossa compreensão do prolongamento da vida?
Com a pandemia, emergiram questões escondidas sob o tapete da nossa afabilidade cujo non sense é friamente comprovado por todas as estatísticas. A primeira delas é a de que a Covid-19 é uma “doença de velhos”, fama anteriormente levada pelas conhecidas e temidas Osteoporose, Artite, Parkinson e Alzheimer. O que se comprova é que os óbitos de idosos por Covid-19 estão associados a pelo menos mais um fator de risco, como problemas cardiovasculares, diabetes ou outros tantos, fato amplamente veiculado em todas as mídias.
Pesquisas recentes mostram que boa parte das pessoas inconscientemente traça uma linha entre os mais velhos e o “resto de nós”. Essa mentalidade do “nós contra eles” contribui para uma série de problemas sociais, pois perpetua crenças estereotipadas, criando uma mentalidade de soma zero: mais para “aqueles” ou “eles” significa menos para “eu” e “meu”. Uma equação na qual todos perdem.
Isso ocorre porque o etarismo repousa sob nosso manto social. Está na mídia, em nossos canais de comunicação, nas redes sociais, nos filmes, novelas, exigências de padrões de beleza, nas brincadeiras ou piadas que fazemos, nas etiquetas dos produtos de consumo que não conseguimos ler, nas roupas que não nos representam, nos modelos estereotipados de uma velhice única e monolítica, igual para todos.
No ambiente de trabalho, boa parte dos estereótipos negativos relacionados à idade mostram-se igualmente fragilizados frente às evidências empíricas apontadas em estudos nacionais e internacionais. Porém, profissionais mais velhos ainda deixam de ser contratados, desenvolvidos ou promovidos em função do critério idade por conta de vieses frequentes, muito sutis, presentes nas práticas e políticas de gestão de grande parte das empresas no Brasil e em diversos países.
Voltando à nossa cápsula e à nossa intenção de sairmos dela transformados em seres melhores, cabe a pergunta: o que podemos fazer para minimizar os estragos trazidos pela Pandemia sobre os idosos e o preconceito que recai sobre eles, ou melhor, sobre todos nós ao cruzarmos essa linha invisível que separa a maturidade da velhice?
Refletir sobre o tema é certamente o primeiro passo. Leia, informe-se, pense. Sem julgamentos, de você para você: qual é a sua posição? Você tem esse preconceito? Pense em situações práticas. O autoconhecimento costuma ser uma mola propulsora para integrarmos questões éticas e nos reposicionarmos.
O segundo passo é falar sobre o assunto, trocar ideias, fazer com que as pessoas pensem sobre algo de que talvez nem tenham consciência. Temos que romper essa zona de conforto, investir nosso tempo e esforços para não deixar que fiquem presas no paradigma da aceitação passiva do etarismo.
A partir daí, as possibilidades são infinitas! Se você percebeu a relevância do assunto e seus impactos no seu futuro e da sociedade, você certamente terá ideias de como prosseguir! Conto com a sua ajuda para que nossa aterrissagem ocorra num mundo melhor!